14.1.12

Onde vivem os MEUS monstros

Wade Langley

Eu me escondo em casa e prendo a luz do dia do lado de fora. É minha maneira de me manter á salvo do que me queima a pele. Me encontro escondida em baixo da cama, conversando com meus monstros de estimação. Escolhi um bonito nome para cada um deles, afinal, eles já viviam há tanto tempo comigo que era no mínimo falta de educação chamá-los apenas de monstros. Quer saber? Eles parecem comigo e se duvidar, tem medo da própria sombra. Eles vigiam meu sono ao invés de perturbar meu descanso. Só eles me vêem brincando de ser eu mesma, porque não preciso me esconder deles para rir sozinha no espelho. Ninguém mais precisa saber o que faço quando estou sozinha. Ou quem sou quando ninguém está prestando atenção em mim. Ninguém me vê dançando nua no espelho, inventando desenhos em maquiagens de palhaço, pintando as unhas de uma cor que vou limpar antes de sair de casa. Quando eu era pequena, me escondia no quarto da minha mãe para vestir as roupas dela em frente a um enorme espelho. E embora eu ainda vista roupas da minha mãe de vez em quando, hoje brinco com as minhas próprias fantasias. Aquelas do dia-a-dia, que uso quando saio fingindo por aí que sou uma moça séria. Ou que ainda sou uma menina de jeans, allstar e mais uma camiseta nova do Garfield. Ou da Mafalda. Eu canso do salto alto e das blusas de botão. Eu canso dos cabelos alinhados. Eu canso de mim mesma e corro pra casa. Me escondo no quarto escuro, porque tenho medo dos insetos atraídos por essa luz que dizem que a gente traz no peito. Quem precisa de insetos voando dentro do peito? E se não forem os tais insetos que chamam de esperança? Não vou me arriscar. Eu espero o tempo passar, mas também tenho medo de envelhecer e secar, feito árvore plantada longe do rio. Feito a sombra que resta dos sonhos que não estão mais vivos. Acontece que a gente vai se acostumando com o próprio mundo e se esquece que alguns dos nossos maiores sonhos, só sobrevivem no mundo que existe fora de nós mesmos. Eu acordo todos os dias e saio pelas ruas carregando minhas certezas embaixo do braço. Eu e toda a minha vontade de voltar pra casa antes que alguém derrube minhas certezas pelo chão. Antes que alguém se ofereça pra recolher o que ficou espalhado pelo caminho. Volto para os meus monstros imaginários antes que alguém repare nas minhas janelas fechadas. Antes que alguém enxergue a tal luz que eu só vivo para esconder. Antes que alguém mate meus monstros e me faça enxergar que eles só existem enquanto os chamo pelo nome.
Eu digo que sou livre, mas na verdade, estou apenas fugindo. Só que ninguém mais sabe disso.


Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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