Despeço-me do menino que ouvia Chico Buarque tão alto nos fones de ouvido (e tem vezes que precisamos ouvir assim mesmo), que todos no ônibus puderam ouvir. Despeço-me da senhorinha simpática com uma florzinha roxa nos cabelos brancos, pra quem cedi meu lugar no metrô. Despeço-me da moça loira que me sorriu quando me desculpei por ter pisado no pé. De salto alto. Despeço-me do rapaz de olhos verdes que me encarou todo o percurso do trem. Despeço-me do ambulante que me vendeu amendoins e me deu sorrisos de troco. Despeço-me do senhor que me pediu pra ajudar a atravessar a rua. Despeço-me da criatura sem educação que veio na van ouvindo funk no viva voz. Despeço-me do motorista que parou fora do ponto porque eu sorri pra ele. Despeço-me do cachorrinho que fez festa quando passei na rua. Despeço-me das crianças que passaram correndo, voltando da escola. Despeço-me da jovem mamãe que passeava com seu bebe no calçadão. Despeço-me do turista que vai embora da praia vermelho feito um camarão. Espero que ele não tenha esquecido a loção. Despeço-me do ciclista que passou pela ciclovia e fez psiu quando eu passei. Despeço-me de tudo que me cerca, de tudo que eu vejo e de tudo que não verei mais.
Sento na pedra e observo o pôr do sol aqui no Arpoador. É único. Despeço-me dele também, porque nunca mais verei outro igual. Despeço-me da vida que tive hoje, porque amanhã será outra.
Aceno pro barquinho a deslizar, no macio e azul do mar.
O barquinho é um poema de despedida. É um instante que não volta. É a pressa do que não será.
Despeço-me do que ficou pra lá. Despeço-me do que passou por mim.
O problema, é que nem toda despedida é fácil assim...
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