30.11.07

A Canção do Sonho


Fotografia: We♥It


Parecia um dia normal – na verdade era um dia normal, o universo ao meu redor é que estava anormal.
Hoje eu acordei e tudo a minha volta pareceu diferente.
Era o mesmo quarto, as mesmas coisas, as mesmas prateleiras e as mesmas roupas espalhadas pelo chão. Mas havia alguma coisa estranha no ar, no clima.
Era um cheiro de mata, de floresta – coisa incomum nas grandes cidades.

Olhei pelo vidro da janela e vi uma estrada que eu nunca tinha visto antes.
Muitas árvores, muitas flores, pedras e uma estrada. Esfreguei os olhos pra ver se enxergava a cidade cinza de todos os dias, mas ela não estava mais lá.

Que tipo de realidade abstrata me transporta para um lugar oposto ao que eu vivo no breve espaço de tempo do meu sono? Vai ver que eu ainda não tinha acordado – e se estava sonhando, pra que perder tempo com divagações?

Levantei e tentei abrir a porta, mas ela estava trancada.
Havia uma placa que dizia: “as palavras certas abrem portas certas, mas as palavras erradas trancam todas as portas”.
Então, se eu usasse as palavras erradas, haveria de passar o resto dos meus dias trancada nos cômodos nada cômodos das minhas escolhas mal feitas?
E se ao invés disso eu ficasse aprisionada no medo de dizer as palavras que não fossem as palavras corretas?

Voltei para o quarto, olhei novamente a estrada e pensei em pular a janela – mas ela também estava trancada pelas palavras não ditas. Um mundo inteiro de possibilidades me aguardando do lado de fora e eu trancada no meu medo de dizer as palavras erradas...
Não é algo que faça muito sentido, mas pode acontecer – nessa ou em outra realidade qualquer, com ou sem uma estrada tão convidativa me esperando.

Existe uma estrada a percorrer e um caminho a trilhar. E existem palavras que abrem portas e nos levam a novos caminhos. Existem palavras que nos atravessam como ventanias, que nos cortam como facas, que nos sangram como ferida aberta que não cicatriza. Há palavras que são capazes de tornar morte o que é vida e destruir todo sentido de um sorriso. Há palavras que retrocedem os passos e embaralham caminhos.
Existem palavras que criam novos mundos, realidades paralelas e novos sentidos a coisas sem sentido.
Existem palavras que nunca foram ditas e por nunca serem ditas, nunca foram pensadas.
Algumas se escondem atrás de sua intenção – querem esconder o que são ou o motivo pelo qual foram ditas.
Outras querem tanto ser ouvidas, que precisam ser gritadas.

Mas existem aquelas palavras raras, as não ditas, que não podem ser faladas em qualquer hora, em qualquer lugar e muito menos para qualquer pessoa.
Palavras que se dizem sozinhas, através de gestos, sorrisos, olhares...
E são silêncios recriados ligados ao verbo e sentidos percebidos desenhados nas frases.
Desconfio que a palavra que abre portas seja uma dessas palavras raras, tímidas, mas cheias de sentido.
As palavras raras fazem da estrada um poema e do poema uma canção.
Talvez essa que te ouvi cantarolando assim que eu acordei...


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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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