16.9.08

Pra sarar

Ou, título alternativo: Dos Sapatos


Corria e dançava descalça pelo jardim cantando baixinho uma musiquinha que uma professora tinha ensinado. Sabia que tinha algumas palavras trocadas, mas cantava como se a sua versão fosse a certa. Afinal, inventar suas proprias canções era muito mais legal do que cantar as que já estavam prontas. Pelo quintal, brinquedos, gibis da Turma da Mônica, peças perdidas de lego, de damas, jogos e bonecas espalhadas por todo canto.
De vestidinho florido, feito pela Avó, rodopiava observando o movimento da saia rodada.
E ria...
Caía de bunda no chão e tornava a rir, porque tudo é uma brincadeira e cair era tão engraçado quanto rodopiar.
Ás vezes pisava numa pedrinha ou tropeçava em algum brinquedo e corria pra dentro de casa chorando. Logo era advertida pela mãe, que sempre chamava atenção da menina por andar descalça sem olhar por onde pisava.
Ela fazia bico, cruzava os bracinhos e sentava emburrada no sofá. Curtia uns breves momentos de rebeldia e pirraça, mas logo ficava inquieta e pedia "aquele beijinho pra sarar".
Num passe de mágica - ou melhor, do beijo carinhoso da mamãe, tudo se dissolvia, toda dor passava e ela voltava a correr, pular e dançar descalça pelo quintal. Certa vez, pisou num caco de vidro. Mas sempre voltava a andar descalça por aí. Vez ou outra tropeçava num brinquedo ou encontrava novas pedrinhas pra pisar. Mas sempre tinha "aquele beijinho pra sarar" capaz de resolver qualquer problema, curar qualquer dor ou resolver qualquer catástrofe.

Eu ainda tenho mania de andar descalça sem prestar muita atenção por onde eu piso.
Essa lição, a dos sapatos, eu nunca aprendi.
Com o passar do tempo, percebi que nem tudo aquele carinho é capaz de curar, mas isso nunca me impediu de tentar:


"-Ôôô Mãe, dá um beijinho aqui??? É pra sarar..."

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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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