Com os cotovelos apoiados nas janelas e as bochechas afundadas nas mãos, vejo quando você passa saltitante, com seu vestido esvoaçante do outro lado da calçada. Você nem disfarça, somente sorri e acha graça dessa minha cara de criança birrenta, sempre contrariada. Enquanto tanta gente brinca nos balanços e carrosséis da pracinha, fico parado com o pés cada vez mais afundados na areia. Não, a areia da pracinha não é movediça, eu que tenho o dom de me afundar em qualquer lugar que seja. Na lama dos dias. No lodo da chuva. Na falta de propósito. Na preguiça. No travesseiro. No peitoril da janela olhando a rua enquanto você passa. Se a vida for um vôo rasante, permaneço chumbado ao chão. Sempre olhando de longe enquanto as pessoas mergulham no mar, não por medo de morrer afogado e sim por medo de me afundar na areia enquanto caminho. Sempre olhando de fora a vitrine de lojas de brinquedos, não por falta de condições de comprá-lo, mas por achar que eles não são para mim. Você passa saltitante, leve, sorridente e me olha com o olhar impenetrável de quem busca nos meus olhos uma resposta que nem eu mesmo tenho. Talvez você se pergunte o mesmo que eu: mas que diabos de peso tão enorme é esse que carrego aqui dentro que me faz afundar tanto em mim mesmo?
"Quando as circunstâncias são más, elas têm o dom de estragar o que, não fosse por elas, seria agradável."
~Lemony Snicket
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