17.11.10

Carta com pressa


Escrevo-te essas mal traçadas linhas...

Você já conhece a minha mania de falar quase sem respirar. E de escrever da mesma maneira, sem dar muito tempo ao raciocínio. Caso contrário, acabo não escrevendo o que realmente penso. E sinto.
Por isso estou escrevendo essa carta assim, com essa letra garranchada, sem passar a limpo as palavras manchadas de pressa.
Só peço que você me leia com a mesma urgência. E um pouco de paciência. Me leia sem revisões, sem riscos nas minhas palavras e sem correções nos meus verbos mal colocados. Só espero que você leia aquilo que não escrevo. Me leia, mesmo sem seus óculos. Me leia de longe, de perto ou em braille. Mas não me interprete. Não me disserte. Principalmente se você for me racionalizar. Não tente, por favor, me fazer ter um sentido. Porque não o tenho.
E tudo isso você já sabe. Apenas ouça quando digo sem palavras, monossilabicamente, o quanto te quero. E é muito. Ou o quanto estou feliz por estar onde estou. E não é pouco. 
Você já conhece a minha fama de ovelha negra. Era de se esperar que eu não valesse grande coisa. Mas entenda: se te mostrei o pior que havia em mim, foi só para que enxergasses o que tenho de melhor.
Meu infinito particular* que já não é tão particular assim. É também seu, porque te deixei entrar, conhecer, explorar. E se te restam dúvidas, é só perguntar. Não, não tenho manual, mas não sou tão difícil de ler*. E você entende tanto de letras... Sabe aquilo que disseram na música, sobre ainda ser a mesma pessoa mas passar a gostar de ser? Pois é, moço. Parece que voltei a ser alguém de quem eu gosto. Ao menos, gosto quando com você. E gosto de escrever pra você. Sobre você. Em você. Escrever escondido enquanto você dorme ou na sua pele enquanto você me suspira. E me respira. E me sussurra.
Leia meu sorriso enquanto te cheiro. Leia minhas mãos enquanto te toco. Trace meu destino nas linhas da minha mão enquanto seguro as suas. Enquanto te marco a pele para ler-te meu. Leia meu mapa astral enquanto fecho os olhos serenados das estrelas dos teus olhos. 
Você deve ter ouvido falar da minha mania de ir embora. Que dormiria do meu lado e acordaria sem minhas mãos no teu cabelo. E isso, nenhuma cigana precisaria prever em suas cartas cortadas. Eu iria mesmo embora, você bem sabe disso.
Você só não podia esperar que eu quisesse mesmo, tanto e muito ficar. E esse teu medo que eu vá embora faz menos sentido do que um telefonema de madrugada que finge estar tudo bem. Que mascara a intenção, mas não disfarça a voz. O tom. O Som.
Me leia! Com  mesma pressa que relato. Com a mesma urgência que me consome ao te escrever essa carta. Me leia com a certeza que me tens como esse papel amassado tem minhas palavras. Escritas. Transcritas. Corridas. Nessa pressa de te encontrar e fazer-te entender sem palavras aquilo que não digo. Me leia! Com prefácio, prólogo e orelhas. Me leia a pele, o gosto, os olhos. Me leia nua e me saiba tua.

Me abandono contigo para que tenhas a certeza de que volto.

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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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