30.7.07

Eu Não Sei Escrever o que eu Sinto


Eu paro pra ler as coisas que você escreve e fico me perguntando de onde você tira as palavras certas no momento exato em que eu preciso ler. Já não bastasse que tua imagem me perturbem os olhos, as coisas que você diz me perturbam os pensamentos. Te leio e fico horas, dias, repetindo e ecoando tuas palavras em mim. Da vez que escrevestes aquele texto todo pra mim, fiquei trêmula lendo cada frase, atônita em notar como o ziguezaguear de tuas idéias me desvendam e me confundem. Eu sei, na verdade você não escreve para mim e é isso que mais me perturba. Você escreve para alguém muito parecido comigo? Ou para um ser imaginário que você desconhece e que na verdade, só pode ser eu mesma? Se as almas das pessoas se encontram em sonhos, isso bem que poderia ser possível. E assim quem sabe, mesmo sem me conhecer, você também sonhe comigo e de alguma forma mística, me imagine exatamente como eu sou. Isso explicaria porque eu me encaixo tão bem nas fôrmas dos teus poemas. Eu contemplo num silêncio gélido o turbilhão de sentimentos que me atravessam e não consigo explicar. Tanta coisa me corta: raiva, amor, compaixão, intolerância, sentimentos freqüentemente inexprimíveis. E de repente, você me descreve, me desvenda, expõe os sete segredos que nem eu mesma desvendei ainda. Eu fico aqui, petrificada, esperando insanamente que você exista de verdade, que você não seja mais uma armadilha da minha mente.
Eu fico sem jeito, sem fala e constantemente sem palavras - sem as palavras que não lhe faltam. E você usa todas, desfere-as em minha direção, precisas, me fazendo sentir esse desabandono* e essa sensação de exposição. E não acho que seja tudo fruto da minha imaginação, eu não iria tão longe.
Então, se alguém como você, de repente soubesse quais são as minhas máscaras, eu me sentiria ingênua de continuar me fantasiando com elas. E se alguém como você fosse capaz de interpretar o que sinto, eu não precisaria desse orgulho pra demonstrar o que realmente me abala.
Você saberia. E seria você esse motivo. Porquê você me tira do eixo.
Alguém como você, certamente veria as ruínas que eu escondo atrás da fachada de uma fortaleza.
Talvez nem fosse tão bom assim que alguém como você tivesse tanto conhecimento das coisas sobre mim. Talvez eu fugisse exatamente por achar que você sempre me entenderia, porque a maioria das mulheres diz que precisa ser compreendida, quando na verdade querem ser amadas.
E o que seria a mulher sem seus mistérios, sem seus segredos?
Mas você... Eu não sei, mas as coisas sobre você me parecem muito além de meras suposições.
Não é como num jogo de xadrez, não é como querer desvendar as ações do oponente, não é como proteger a rainha ou evitar um xeque-mate. Eu não quero vencer você. Eu não quero jogar com você. Eu não quero desvendar você.
Eu quero saber como você faz pra me interpretar desse modo assombroso que você faz, mas se você não souber como me explicar, tudo bem, eu me conformo contanto que você continue. Já que você se propôs a me entender, por favor, me entenda, e quem sabe me entendendo, você possa me explicar tudo aquilo que eu ainda não sei sobre mim. Por mais que eu teime e insista, não adianta, não sei escrever nada do que sinto. Mas você sabe, você transcreve meus sentimentos como ninguém. Ainda que você não saiba que o que você escreve são os meus sentimentos que, de alguma forma, vão parar nas suas palavras. Não pergunte como, apenas continue a escrever.
Eu leio tudo o quanto você escreve e sinto que uma parte de mim já esta perdida em você, uma parte que eu talvez não queira, ou não possa resgatar.





*desabandono – neologismo: desabandonar, deixar de abandonar



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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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