18.4.10

Felicidade Instantânea

Com a roupa encharcada, a alma repleta de chão, todo artista tem que ir aonde o povo está


Sim, eu sei que é o título de uma música do Cpm22. Sim, eu também sei que você acha que eles saíram de moda e são uma bandinha emo, mas quando os ouvi na rádio, percebi que eu também queria berrar umas coisas aos quatro cantos do mundo. Na verdade, eu queria ser vocalista de uma banda de rock pra tocar nas rádios, fazer shows e aparecer na televisão. O problema é que eu não sei cantar.

Eu queria ser famosa e ter mil repórteres me seguindo querendo saber o que eu penso, querendo saber o que eu faço. Minha mãe guardaria todas as revistas com meu sorriso estampado. Diriam o que eu faço pra manter a forma, especulariam minha vida amorosa, diriam que fui vista numa festa com o galã da novela das nove e que não me dou bem com a mocinha da novela das seis. Ririam de mim no quadro de erros de gravação do programa da tarde e me chamariam pra cozinhar no programa da manhã. O problema é que eu não sei cozinhar.

Mas ainda assim, eu queria ser famosa e aparecer no programa de fofocas do outro canal.
Queria mesmo fingir que me irrito com os paparazzis, quando na verdade eu adoro aparecer.
Tantas vezes fiquei parada em frente ao espelho simulando um grande show, uma grande cena... Tantas vezes eu fingi ser quem não sou e ensaiei frases que não eram minhas pra dizer aos outros. Teve até aquela vez que eu fiz como participantes de reality shows e fiz amizades instantâneas e inquestionáveis em um dia. Eu já inventei tantas histórias mirabolantes, tantas crises incompreensíveis...
Chego à conclusão de que sempre me faltou uma câmera. Eu nasci pra ser famosa!

Mas não sou! Não tem uma câmera filmando o que eu faço embaixo do meu edredom. Não tem um grito de "corta" quando eu termino de fazer as minhas cenas. Não tenho um dublê que se machuca por mim. Sou eu mesma que caio da barra, que rolo escadas abaixo, que tomo caixote no mar. Não tenho um script para decorar, eu mesma sou responsável pelas minhas falas e por tudo que eu faço. Não tem vilão e nem mocinho porque eu não tenho como saber quem é quem. São milhões de pessoas contracenando diariamente na minha vida. Figurantes ou não. Não tem um "viveram felizes para sempre" nem o enlouquecimento ou a prisão de todos os bandidos.
Eu sou telespectadora da fama alheia.

Mas eu quero acreditar que existe uma alma gêmea, que existe um "até que a morte nos separe", que existe um amor indiscutível e que eu posso ficar bonita com aquele corte de cabelo impossível.
Quero acreditar que é possível esquecer que eu sou rancorosa e perdoar a quem me fez mal, nem que seja no último capítulo. Quero que aquelas dietas milagrosas das famosas sejam todas verdadeiras e funcionem. Quero acreditar que todas as pessoas são capazes de aprender com os próprios erros e aprender a não cometê-los novamente. Que todas as pessoas estão por aí procurando uma maneira de ser melhores ao invés de só tentar se dar bem. Quero acreditar que elas querem se esforçar para fazer o melhor das próprias vidas ao invés de só querer audiência.
Mas o problema, é que eu não acredito em nada disso. Na verdade, eu acredito em poucas coisas.

Eu acredito que um erro não justifica o outro. Acredito que as pessoas não mudam conforme a necessidade, mas com o tempo. Acredito no sucesso conquistado com esforço, não com escândalo. Acredito que se você me chama pra fazer fofoca dos outros, chama os outros pra fazer fofoca de mim também. Acredito no caos. Eu acredito que perdoando uma traição, serei traída novamente. Acredito na falta maturidade da mulher que cai na conversa de qualquer canalha e ainda defende dizendo que "ele trabalha demais" ou "mas eu sei que ele me ama". Acredito no tanto de homem machista que ainda existe. Acredito que aquele seu vizinho lindo é gay e namora aquele meu vizinho mais lindo ainda. Acredito que sua mãe é oprimida pelo seu pai autoritário e que você é inseguro por causa deles. Acredito na sua boa vontade apesar dos seus atos desastrosos. Acredito que atinjo várias pessoas enquanto elas pensam que eu escrevo para alguém específico, quando na verdade estou conversando com a minha imaginação. Talvez eu ainda acredite em algumas outras coisas, mas é tudo muito pouco e superficial. Quase fútil. Eu acredito em mim e não acredito em mais nada.

Ser famosa resolveria parte dos meus problemas. Talvez só os mais fúteis. Eu poderia, por exemplo, ser capa de revista masculina e ter o corpo perfeito que eu não tenho, porque existe retoque. Eu poderia vender minha imagem ao invés das minhas idéias. Minhas idéias nunca me levaram às editoras nem às listas dos mais vendidos.
Queria ser famosa pra encontrar a tal vida melhor que a minha que todos os famosos insistem em ostentar.
Mas eu acho que eu nunca vou ser famosa.

Talvez a minha felicidade não seja instantânea como aquela foto do novo casal de famosos que apareceu estampada na primeira página do jornal. Talvez a minha felicidade não esteja em apenas um clique, em uma página de revista de vida de artista. Talvez eu consiga ser mais do que um instante.
A minha vida não pode ser uma cena momentânea, um registro efêmero ou um acontecimento súbito.
Eu não tenho o registro de um paparazzi nas revistas e nas bancas de jornal, mas tenho algo melhor: tenho o registro informal dos meus amigos no instantâneo da Polaroid ultrapassada colado no mural do meu quarto.
E é só olhar para essa foto que encontro a minha felicidade instantânea.

Eu só queria ser famosa pra quebrar a minha rotina de ser eu mesma, não para ser feliz!


"Olá! Sou eu que faço as canções pra você chorar!”.





Hey peoples... 
Conhecem a música? 
Eu ouvi por acaso "Felicidade Instantânea" 
e não consegui mais parar de pensar no tema, 
mas ela não tem muito mais a ver com o texto além do título. =D

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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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