10.10.14

Resenha: O Lado bom da Vida


Pra começar, dê o play aqui:
...vamos de post com a música d'A Banda mais bonita da cidade.
E um abraço pra você que acha que eles só tem uma música.

O Livro

Vocês conhecem alguém que busca sempre ver o lado bom da vida? Uma pessoa que deteste assuntos negativos ou histórias deprimentes? Você pode até conhecer alguém sempre disposto a encarar as coisas de um ângulo melhor, mas nenhuma delas é como Pat - o protagonista dessa história.
O nome original do livro é “Silver Linings Playbook”, uma expressão que numa tradução não literal, significa que várias coisas ruins que acontecem podem resultar numa coisa boa. 
"Silver linings" são linhas de contorno das nuvens quando o sol está encoberto por elas. O sol está escondido pelas nuvens, mas continua iluminando. É um jeito Pollyana de ver as coisas: ver sempre o lado bom de tudo. E é nisso que o personagem principal acredita, é essa sua filosofia de vida.

(em tempo: se fosse escolher pelo título eu jamais teria lido)

O Lado bom da Vida é um livro narrado em primeira pessoa pelo seu personagem principal: Pat Peoples. Durante boa parte do livro, Pat não se lembra do que fez para ter ido parar num hospital psiquiátrico. O leitor também não vai saber até que ele se lembre, porque é ele quem conta a própria história. Quando Pat fica confuso ou perde o controle, a narrativa fica intensa junto com ele. Aos poucos o leitor vai tendo pistas dos motivos para os surtos, de como a mente de Pat funciona e invariavelmente, se envolve com ele. Mas não é pra menos, Pat é um personagem cativante. Apesar de saber desde o inicio, nas entrelinhas, que ele fez algo de muito grave, é impossível não torcer por ele.

Então tá, o enredo. Pat Peoples está internado há quatro anos em um hospital psiquiátrico, sem nenhuma notícia do mundo lá fora e sem se dar conta do tempo. Ele ocupa seus dias com exercícios físicos, porque deseja ficar bonito, atraente e sarado para a ex-esposa quando o "tempo separado dela" terminar.
Na verdade existe uma ordem judicial impedindo que ele se aproxime, mas ele não sabe o motivo.
Um dia a mãe dele resolve que quer levá-lo pra casa, assina os papéis e leva Pat embora desse lugar que ele chama de "lugar ruim". Ela tenta se certificar o tempo todo que ele está tomando os remédios, que está controlado, que o pior já passou - e até monta uma super academia particular para que a obsessão que ele desenvolveu por exercícios físicos esteja sob controle. Existe uma preocupação de não tocar em assuntos traumáticos, ela desvia a conversa quando ele pergunta coisas sobre o passado e a ex-esposa, some com fotografias do casal e obriga o filho a ir à terapia - requisito para que ele fosse liberado do "lugar ruim".
Mas Pat tem uma única preocupação: fazer tudo o que for preciso para voltar para a ex-esposa.
"Você precisa saber que são suas ações que fazem de você uma boa pessoa, não sua vontade."
Já o pai não se relaciona bem com ele - nem com ninguém na verdade. Ele é obcecado por futebol e sua vida só está boa quando os Eagles vão bem. A relação de Pat com o pai é re-construída através do desempenho do time. Pat e o irmão Jake também são fanáticos pelo time, mas a relação deles é bem fraternal e bonita. Coisa que não acontece com o pai. É uma relação bem complicada, porém interessante de observar.


A bipolaridade do personagem é descrita de maneira simples, quase inocente, porque o personagem não faz a mínima ideia de que é assim. Ele tem um problema psiquiátrico e precisa tratar, mas ele sequer entende o porquê. Então ele tenta entender e se entender através da ajuda de seu terapeuta, Dr. Patel.

As seções com o terapeuta viciado em futebol americano, são um ponto alto do livro. Eu adoro livros, filmes, seriados e whatever que exploram essa relação paciente/terapeuta. A relação que Pat estabelece com seu psiquiatra e as seções de terapia, foram um ponto alto do livro pra mim.
Outro ponto que eu gostei muito, foi que Pat resolveu ler os livros que a ex-esposa gostava e sobre os quais lecionava, porque queria ficar inteligente para que ela tivesse orgulho dele - mas surtava quando um livro acabava mal e não entendia como ela podia dar aula a jovens com um livro tão deprimente, que não enxergava o lado bom da vida (e aqui ele, sem pudor nenhum, faz spoiler de vários livros - como por exemplo quando ele se enfurece com  Hemingway e cospe o final do livro, inconformado haha).
Ele tenta a todo custo manter a positividade e repete o mantra de "ser gentil ao invés de ter razão".
Conforme Pat vai narrando, você consegue entender como ele pensa, quais seus problemas, seus sentimentos em relação à ex-esposa e porque ele se esforça tanto para ser gentil e ver o lado bom da vida. A narrativa dúbia, demostra a instabilidade de Pat e entrega pro leitor seu estado psíquico.


Ninguém consegue, colega!

Ao mesmo tempo em que Pat tenta lidar com a família e com a ansiedade de voltar logo para Nikki, também tenta voltar a se relacionar com os velhos amigos e num jantar é apresentado à Tiffany.

Então tem Tiffany. Uma garota maluca e tão ferrada emocionalmente quanto Pat.
Nesse momento eu achei que o livro ia virar um clichê garoto-encontra-garota, bem naquele estilo: "ooohh tenho problemas" - "oohh também tenho, seremos problemáticos juntos" - mimimi cai o pano.
Mas Tiffany, além de louca, é bem legal. Uma personagem no minimo interessante - de tão esquisita. Mesmo porque, desde que a personagem é apresentada até o ponto que passamos a gostar dela, entendemos que seu comportamento maluco também é resultado de um grande trauma.
Tiffany não tem traquejo social, não consegue disfarçar quando não gosta de algo, não finge estar feliz quando as pessoas esperam que ela o faça e tem uma agressividade que a torna uma bomba prestes a explodir numa crise de raiva. Ou de choro.
No início, Pat tenta se livrar dela, literalmente corre quando a encontra. Porém, ela se torna a única pessoa que consegue compreender como Pat se sente e como pensa.
Enquanto Pat e Tiffany tentam lidar com seus próprios problemas, existe uma certa urgência de descobrir os limites dos relacionamentos de ambos e os limites da amizade que eles desenvolvem a partir de uma troca de interesses que no desenvolvimento da história se revelam outros.
Pat precisa de ajuda com algo que Tiffany se propõe a fazer, enquanto Tiffany conta com a ajuda de Pat em outra. As coisas, em si, parecem pequenas mas é preciso observar o que há por trás delas. Se a gente observar de perto, parece muito com as coisas que fazemos na vida real.
“Você não deveria estar tentando se livrar de ninguém. Você precisa de amigos, Pat. Todo mundo precisa.”
Embutido no enredo do livro desde o título, existem elementos Augustocuryânicos  de auto-ajuda do tipo "tudo vai ficar bem se você crer nisso" e essa ideia Pollyânica de "ver o lado bom de tudo". Eu acho auto-ajuda um tremendo pé-no-saco, porém, nessa história não me incomodou muito devido ao fator ironia.
É no mínimo engraçado de ver duas pessoas extremamente malucas tentando provar que não são malucas em meio a crises de instabilidade crônica e escândalos na vizinhança.
Talvez outros leitores se incomodem com o uso dessa positividade, que às vezes soa meio exagerado - mas no contexto dos personagens, tudo soa meio sarcástico.
Como se você fosse se consultar com um dentista de dentes podres ou visse um gago tentando trabalhar como locutor de futebol.


No geral, achei o livro leve e sensível. Ele mostra a instabilidade emocional de personagens diferentes, mas cativantes. Além de nos faz pensar nas diversas maneiras que as pessoas enfrentam seus próprios traumas e instabilidades emocionais.
É uma leitura gostosa, que vale a pena. Eu não me arrependi!

Classificação: 4 Capuccininhos

O Filme

Só serviu para dar rosto aos personagens.

A versão cinematográfica foi estrelada por Jennifer Lawrence e Bradley Cooper. E é isso que salva porque são dois lindos. De um modo geral, o filme tropeça muito feio no roteiro original e infelizmente perde toda a essência do livro.
Aliás, várias coisas, no filme são diferentes: o sobrenome do personagem principal, o tempo que Pat fica no "lugar ruim", ele saber logo no inicio do filme coisas que ele só descobre no final do livro, a relação com o o irmão, a relação com o pai (que no filme é o inverso de como é no livro), a relação dele com os Eagles, as música citadas e tão importantes na história, Nikky (Deus, pq?), o terapeuta que é muito mais legal no livro, o amigo do sanatório e além de coisas que só acontecem no filme e não no livro - e que se eu falar aqui vai ser um tremendo spoiler. Se já não tiver sido. Enfim, o filme me decepcionou muito, por isso vou ser chata, implicante e clichê ao dizer que o "o livro é melhor". E nesse caso, bem melhor! O filme banalizou o livro, transformou uma história bacana numa comédia romântica muito mais-do-mesmo. A impressão que eu tenho é que pegaram a história central do livro e florearam em volta sem pudores - cagaram o roteiro. Nada mais explica.
E de quebra, estragou minha imaginação hahaha. Digo a mesma coisa que disse na resenha do livro "Um dia": quando surge uma versão cinematográfica de algo que ainda não li, acabo imaginando os atores mesmo como os personagens.
Se você achou o filme meio bunda mole, leia o livro! Além de muito melhor, as relações são mais concretas e as crises mais profundas.


Dito isso, fiquem com o trailler e logo abaixo, dêem a opinião de vocês, ok?
Vai que eu tô sendo chata e implicante sozinha? rs


Ps: Ganhou o Spirit Awards 2013 nas categorias: Filme, Diretor, Atriz e Roteiro. Melhor atriz no Academy Awards. Recebeu oito indicações Oscar nas categorias: Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Atriz, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Edição. Venceu apenas a de Melhor Atriz. Recebeu quatro indicações para o Globo de Ouro e venceu o de melhor atriz. Ou seja: Jennifer Lawrence tá diva, uma deusa, uma louca, uma feiticeira. 
Mas nada vai me convencer que estou reclamando a toa, apesar de saber que sou chata mesmo! 

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Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
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