6.5.15

Passarinha - Kathryn Erskine


Livro bonito, bem construído e com o poder de aquecer o coração de quem lê? Tá tendo!
“Embora eu não gostasse da empatia ela é uma coisa assim que chega sem avisar e faz você sentir um calorzinho gostoso no coração.”
Passarinha foi o primeiro livro que li em 2015 e ao pensar em trazer uma resenha para o blog, não pude pensar em outro. Ele é tão lindo, que a minha vontade é comprar vários e sair distribuindo.

A autora,  Kathryn Erskine, ganhou vários prêmios com esse livro, inclusive o National Book Award 2010.
Kathryn mora no estado da Virgínia, onde aconteceu um massacre na Virginia Tech University, em 2007. A autora ficou profundamente chocada com o acontecido. Ela queria entender como uma família sobrevive a uma tragédia como esta, então ela relacionou a história da violência, o impacto que um caso assim causa na vida das pessoas e de uma comunidade e como uma criança com necessidades especiais lidaria com algo assim.
Em Passarinha, a personagem principal tem a síndrome de Asperger, assim como a filha da autora. Seu objetivo sempre foi que as pessoas compreendessem melhor como é o mundo através dos olhos de um portador da síndrome de Asperger. A menina do livro não é a filha de Kathryn, mas ela emprestou várias coisas que vivenciou com a filha para a personagem. Se você quiser entender melhor o que é essa síndrome e como ela afeta a inteiração social de seus portadores, clique aqui.
Ou melhor, dediquem 4 minutinhos do seu tempo para ouvir a própria autora explicar um pouquinho:


Passarinha é um livro de sutilezas e simplicidades cativantes.
Antes de iniciar a leitura da narrativa, existe uma nota de esclarecimento da tradutora, Heloisa Leal, explicando a construção da autora: o jogo de palavras, a existência de palavras com letra maiúscula no meio das frases, a ênfase de como as palavras representam o pensamento da personagem, as relações de simetria entre palavras iguais com significados diferentes e tudo o que torna esse livro uma experiência única de inserção em um mundo tão diferente do nosso.

Como o grande objetivo de Kathryn era que as pessoas pudessem enxergar o mundo como Catlin, a personagem principal, enxerga e assim entender melhor o mundo do portador de Asperger, o livro é contado em primeira pessoa.
Isso significa que Passarinha é um mergulho na mente confusa de uma criança com Asperger. Você só vai saber o que ela sabe, você só vai entender o que ela conseguir entender.
E é aí que a essência do livro se revela.
“Eu gosto das coisas em preto e branco. Preto e branco é mais fácil de entender. Cor demais confunde a cabeça da gente.”
Caitlin tem apenas dez anos e tem síndrome de Asperger. Ela está enfrentando uma grande tragédia familiar e precisa lidar com isso, além de ajudar o pai a superar perdas irreparáveis. Mas Caitlin não sabe como fazer isso. Muitas coisas ela não consegue entender, mas sabe que algo precisa ser feito para que possam seguir suas vidas.
O título original do livro é Mockinbird, em referência ao filme “To Kill A Mockingbird” (O Sol É Para Todos). O livro faz várias referências ao filme e é também um jeito que Devon, irmão de Catlin, usa para que a irmã entenda determinadas coisas. O irmão a chama pelo mesmo apelido da menina do filme, Scout. A família de Devon e Catlin é igual a do filme: um pai que cuida sozinho dos filhos porque a esposa morreu. Essa referência facilita a compreensão que Catlin tem da própria família. 

A gente tende a pensar que os autistas não sabem conviver com as pessoas, mas a verdade é que as pessoas é que não sabem conviver com eles. Querem exigir que eles  se comportem e tenham atitudes como as nossas e por muitas vezes tentamos ensinar coisas que, se pararmos pra pensar, não fazem muito sentido nem para nós mesmos. Por exemplo, como você quer ensinar uma criança a manter o controle se você perde a paciência com ela e não consegue se controlar?
A autora nos mostra como a paciência é importante e mais do que isso, como as palavras tem o poder de construir pontes e elos.
Para Catlin é difícil "captar o sentido" do que as pessoas querem dizer. Ela não gosta de olhar nos olhos das pessoas, não gosta que invadam seu espaço e nem que toquem nela. Catlin gosta de ler livros e dicionários porque considera eles mais fáceis de entender - ao contrário das pessoas, livros não mudam de opinião. 
Graças ao dicionário, Catlin lê a palavra "desfecho" e ao tentar compreender o significado, se convence que é exatamente o que ela e seu pai precisam: um desfecho. Mas ela não sabe como conseguir isso e nem como fazer esse desfecho acontecer, mas está determinada a alcançá-lo de qualquer jeito.
O bom dos livros é que as coisas do lado de dentro não mudam. As pessoas dizem que não se pode julgar um livro pela capa mas isso  não é verdade porque a capa diz exatamente o que tem dentro. E não importa quantas vezes você leia aquele livro as palavras e imagens não mudam. Você pode abrir e fechar os livros um milhão de vezes que eles continuam os mesmos. [...] Livros não são como pessoas. Livros são seguros.
Catlin sabe que é diferente das outras crianças, mas não se sente tão diferente assim. Ela sabe que tem dificuldades que precisa enfrentar, mas não aceita ser chamada de "doente". A determinação que ela tem de enfrentar os próprios limites e superar a si mesma a todo instante, é de uma força comovente.
Tentando ajudar o pai a superar a dor que ele sente, Catlin acaba por descobrir o próprio caminho e a si mesma, descobrindo um novo modo de perceber o mundo, relações de amizades, cores, empatia...  Sua visão de mundo é comovente e cativante, apesar de toda a dificuldade que ela enfrenta para entender o mundo, as pessoas, as relações e a si própria. É um livro fascinante e cheio de ternura que encheu meu coração de amor. É emocionante, podem acreditar em mim porque eu não posso deixar de recomendar a leitura dessa obra de arte!

E... Gente... E essa capa maravilhosa? Eu fiquei apaixonada! ♥ Palmas para a Editora Valentina que fez um trabalho lindíssimo!
O ninho, a menininha encolhida no ninho, as cores da capa, a diagramação... Não dá muito mais prazer de ler um livro quando a capa é linda assim? Ao olhar essa capa, a contracapa e a primeira página que lista todos os prêmios que a autora ganhou com ele, uma curiosidade fulminante me consumiu e eu tive que comprar. Devorei o livro em três dias e lamentei quando acabou!
Com palavras simples e contando a história de um jeito extraordinário e inovador, Kathryn Erskine me conquistou num nível, que eu queria ir lá na Virginia dar um abraço nela!

Passarinha não é um livro depressivo, é triste, mas é uma tristeza que é muito bonita. Você tem a exata sensação que a personagem principal está te ensinando alguma coisa muito valiosa, que vai te fazer evoluir de algum modo.
Acima de tudo, é um livro sobre compreender as diferenças entre o mundo que você vê e o mundo que outras pessoas vêem.
É um livro encantador sobre o quanto nossa vida pode ser melhor se aprendermos a compreender uns aos outros.

Classificação: Cinco capuccininhos


Ps: No site da autora (kathyerskine.com) existe um rico material sobre autismo e síndrome de Asperger, endereços úteis, links para artigos, fontes de pesquisa e vários materiais para educadores que trabalham com crianças especiais. Fica a dica!

Comente com o Facebook:

0 comentários:

Postar um comentário

Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
Expresso pra Dois © Todos os direitos reservados :: Ilustração por Rafaela Melo :: voltar para o topo