28.10.08

Alice do Subúrbio

"...nunca tinha visto um coelho com bolso no colete, nem com um relógio para tirar do bolso...". – Lewis Carroll 
 Não é novidade, para os que me conhecem, que Alice no País das Maravilhas é um dos meus livros preferidos. Inclusive, existe um texto sobre Alice neste blog, que é um dos top referências de acesso a este humilde café. E isso foi uma surpresa pra mim. Vocês não imaginam a quantidade de buscas por Alice no Google que caem aqui. Mas voltando ao assunto e falando de Alice pra falar de mim, me vi naquela situação em que Alice conversa com o Gato de Cheshire. Eu não estava no País das Maravilhas, mas acreditava que meu caminho parecia mesmo um conto de fadas. Até que a luz se apagou e me perdi do meu caminho. Ao procurar por aquela estrada, percebi que tinham construído outras por cima dela. Milhares delas. E eu não sabia mais por onde seguia e nem por onde continuar seguindo. Se eu pudesse retomar aquele caminho de antes, com certeza seguiria pelo meu País das Maravilhas imaginário. Mas como encontrá-lo no meio daquelas estradas, rodovias e viadutos com tantos veículos e pessoas transitando ao mesmo tempo? Fiquei atônita observando o movimento das vias, as pessoas indo e vindo enquanto eu permanecia parada, me questionando por onde ir. Por algum motivo, me lembrei do labirinto onde as Cartas pintavam as rosas brancas com tinta vermelha. Elas continuavam sendo rosas brancas pra mim, mas aparentavam ser vermelhas. O mesmo acontece com algumas pessoas. É como se pintassem a alma de outra cor, mas no fundo continuassem sendo brancas. Seria isso que chamam de máscaras? Mas diferentemente das rosas, que não tiveram escolha, são as pessoas que se pintam de outra cor. Contei nos dedos e perdi as contas de quantas pessoas pintadas eu conhecia. Alguns se pintam muito mais bonitos do que realmente são, porque a feiura incomoda os olhos da vaidade. Cheguei à conclusão de que a tinta serve pra esconder o que não deve ser visto, o que queremos esconder - muitas vezes de nós mesmos. Pensando nas cartas e nas tintas, pensei no que aconteceria caso descobrissem essa fraude, caso notassem o que queremos esconder por baixo de tanta tinta vermelha. Estaria tudo acabado e viria alguém ordenando que nos cortasse a cabeça? Também fiquei pensando na quantidade de Chapeleiros Loucos que eu conheço por aí. Pessoas que brigaram com o tempo e vivem um eterno seis da tarde. Pensei no Tempo e imaginei que ele também brigaria comigo se eu o desperdiçasse muito tempo parada no mesmo lugar. Aquela cartola, definitivamente, não combina comigo... Voltando a atenção para a minha falta de rumo, me vi como uma Alice do Subúrbio, sem saber por aonde ir. Essas encruzilhadas, bifurcações, estradas sem fim... Nada parece fazer sentido, não me sinto parte de nenhum desses caminhos e continuo me perguntando por onde devo ir. Lembrei das palavras do Gato perguntando a Alice para onde ela estava indo. Eu sabia muito bem para onde estava indo, mas agora também não sei pra onde quero ir daqui pra frente. Só queria que alguém me apontasse uma direção, mesmo sabendo que sou a única quem pode fazer isso. "Se você não sabe para onde está indo, qualquer caminho serve". Às vezes é necessário andar em círculos pelo mesmo caminho; se perder; se achar - mesmo que seja pelo caminho mais longo; para compreender o rumo certo e entender o que antes não se compreendia. De certa forma, ficar parada foi meu modo de andar em círculos, porque apesar de não seguir em frente e nem em nenhuma outra direção, minha mente não estava comigo, vagueava em busca da direção correta. Pensando nessas coisas, não notei o tanto de tempo que havia se passado, porque o tempo tem esse costume de passar por mim, sem que eu passe por ele. Já havia passado muito tempo desde que eu fiquei parada, naquela posição, sem me mover em qualquer direção que fosse. Nesse momento, um taxista parou na minha frente, perguntando se eu precisava de um táxi. Sem pensar, entrei no carro e apertei o cinto. "-Vai pra onde, menina?" "-Pra qualquer lugar. Só quero sair daqui." "-Então eu vou indo em frente, quando chegar o lugar em que você quiser descer, me avisa tá?" Indo em frente! Após repensar pela enésima vez nessas palavras, desci do táxi e encontrei uma estrada cheia de imperfeições e senti que deveria caminhar por ali. Por um instante, me pareceu a mesma estrada em que eu caminhava antes de seguir aquele caminho para o meu País das Maravilhas idealizado, mas eu nunca mais andarei pelos mesmos caminhos depois de me perder. Nem mesmo eu conseguiria ser a mesma. Chego à conclusão, de que não era a perda do encantamento daquele caminho em si o que me deixara desnorteada e sim, não saber para onde continuar caminhando. Do restante, o eco da voz do taxista que me acordou para o "ir em frente" e a audácia do Gato me dizendo que o importante era ter um caminho e que na falta de um, qualquer outro serviria. E o que me resta daquele passado ainda tão presente, assemelha-se ao que acontece quando as estrelas explodem e sua luz continua flutuando pelo espaço, a milhares e milhares de anos luz da Terra. Olhando pro céu, ainda vemos seu brilho, mas a estrela não está mais lá. Pode parecer triste pensar assim, mas talvez a beleza esteja justamente nessa tristeza do efêmero. Como o brilho de estrelas mortas...

23.10.08

Do Fim


*De repente toda mágica se acabou
E na nossa casinha apertada, tá faltando graça e tá sobrando espaço*


E ainda que eu não tenha uma casinha, mesmo que apertada, ta sobrando tanto espaço aqui...
A mágica acabou mesmo? A magia dissipou-se?
Desentendeu-se o entendimento?
De repente, valores perderam o sentido e o sentido perdeu o valor.
Não foi tão de repente assim, mas o gosto do algodão doce ficou enjoativo.
E eu notei o quanto maçã do amor gruda no dente, gruda na gente,
Suja a roupa, meleca tudo...
E tantos planos desfeitos, sonhos desfiados nas agulhas da rotina, do tempo...
De repente não ouviram minhas preces, vou saber? Vão dizer que elas não alcançaram o céu.
De repente, somos outras pessoas e as palavras que você diz, me parecem mímicas.
E as que eu digo são outro idioma pra você...

*Despeço da magia que balança o mundo*

Talvez eu seja a pessoa errada,
Talvez eu não seja aquela dos seus sonhos.
Talvez cometa desatinos imperdoáveis e não saiba te dar aquilo que você espera de mim.
Talvez eu fale tudo que não poderia e talvez não fale nada do que deveria e exija de você uma compreensão que você não é capaz de assimilar.
Talvez crie mais problemas do que existem de fato e talvez não consiga resolver os pequenos percalços desse nosso caminho...
Mas você também não deve ser aquele dos meus sonhos. Ou pode ser você quem comete os erros mais imperdoáveis de que se tem notícia.
É possível que eu nem seja tão errada assim... É possível que o errado seja você!
Talvez suas promessas tenham sido mesmo todas em vão, talvez você tenha sido irresponsável de dizer coisas que não poderia ou não queria de fato cumprir, me criando esperanças, sonhos e planos que jamais se realizariam.
Talvez você tenha negligenciado coisas que eram vitais que você cuidasse, talvez tenha falado de mais, ou de menos, ou nada disso...

Talvez, nós dois sejamos as pessoas erradas.
As pessoas que durante todo esse tempo, julgaram-se certas uma para a outra sem que de fato fôssemos...
Então eu não sou a mulher da sua vida, como você achava que eu fosse.
E com isso, você não é o príncipe encantado que eu acreditei que era.
Talvez eu nem seja a princesa de algum conto que você ousou contar.
Conto de fadas ou de fardos... Farpas... Sinceramente não sei.
Mas talvez eu seja a mulher dos sonhos de alguém que eu nem conheço.
Talvez exista uma princesa procurando por um príncipe como você.
E esse cara e essa moça, esses sim, nos acharão perfeitos para eles.
Mas também é possível que esse cara e essa moça nem existam de fato...

Agora, eu só posso falar por mim...
Alias, acho que sempre foi assim mesmo, né?
A gente só sabe mesmo daquilo que sentimos, o que pensamos e quem vemos no espelho.
Eu só posso dizer do que sinto e de tudo que você me causa, mas não é esse o caso...
Nem sempre os planos dão certo e nem sempre as coisas acontecem como gostaríamos.
Nós não estamos no controle o tempo todo, somos vulneráveis - essa é a verdade.
Viver é uma grande armadilha, um incerto acontecer, é inesperado...

E embora o mundo seja belo, embora exista felicidade espalhada pelo mundo inteiro, ele não é cor de rosa.
E eu já estou cansada de fingir que enxergo ele assim!



*E pra minha poesia é o ponto final*




Não, não é um conto!
It's the real life, Kid


**Trechos da música:
Saudade de Chumbo - Teatro Mágico

14.10.08

Dos Fatos Inesperados

ou como inesperadamente me encontrei com Renato Russo


Tudo que acontece na vida surge de forma inesperada. Besta é quem acha que tudo parte de um planejamento. Você pode até planejar e executar algumas coisas com sucesso, mas os grandes acontecimentos - bons ou ruins - acontecem inesperadamente.
Como por exemplo, a morte de um parente próximo, o fim de um relacionamento, uma decisão repentina, uma mudança brusca... É de repente que você se vê obrigado a encarar uma nova rotina, uma nova realidade, um novo motivo...
Acontece. Ás vezes é bom e ás vezes não. Ás vezes é tudo que você precisava e outras vezes é tudo que não queria.
Mas acontece...

E me aconteceu de ter que encarar uma nova realidade de uma hora pra outra e foi esse o motivo do meu sumiço. Eu precisava respirar, colocar a cabeça no lugar porque os últimos acontecimentos tinham sido demais pra mim.

Ás vezes, por mais forte que você seja ou que te considerem, você cai tão feio que fica muito difícil se levantar sozinho. Eu caí muito feio e quase não consegui me levantar. Tive todo apoio que eu pedi e inesperadamente, de onde menos esperava e mais apoio do que esperava.
Tudo faz parte de um ciclo que termina para que outro comece e com um impulso e a ajuda certa, você acaba se levantando.

Eu continuo achando que a minha dor não passa na tv e não precisa passar num blog. Também descobri que não posso e não quero usar esse blog como um filtro de tudo que me acontece e que existem meios menos expostos de descarregar aqueles vômitos sentimentais que nos fazem tanto mal. Eventualmente acontece e eu posso acabar fazendo, mas é algo que eu já entendi ser desnecessário ou ter um momento certo.

Inesperadamente, acontecem coisas que te fazem perder a direção, que bagunçam teu caminho e te fazem perder o rumo. E de repente, você precisa encontrar outro.
Outras coisas pra sentir, pra viver, pra pensar, pra fazer...

E falando de novas coisas pra fazer, de repente eu estava em casa, com um amigo ao telefone, quando vi e comentei uma propaganda da peça "Renato Russo" com Bruce Gomlevsky, penúltima semana, em cartaz no Teatro João Caetano.
Sempre quis ver essa peça e das vezes que esteve em cartaz aqui no RJ acabei não indo por falta de companhia ou de dinheiro.
De repente:
-Vamos?
-Vamos. Quando?
-Hoje, semana que vem não posso.
-Mas.. mas... hoje?
-É, vamos. Eu vou!
-Mas eu... mas não vai dar tempo... mas eu moro longe... a hora... mas...
-Vai sim, vamos!
(algum tempo depois)
-Ei, eu vou!

Pelo Twitter, chamei a Talita e ela também foi.
Chegamos em cima da hora e quando entramos no Teatro, o "Renato Russo" já estava no palco. Sim, era ele!
Não, não era o Bruce Gomlevsky, era o Renato Russo mesmo!
Senti aquele arrepio que só mesmo um fã incondicional poderia entender.



Bruce Gomlevsky como Renato Russo


No monólogo acompanhado pela banda Arte Profana, a vida do líder da Legião Urbana é narrada cronologicamente desde os 15 anos de idade, em Brasília, até o final da vida consumida prematuramente pela doença.
Sempre fui fã de Legião e um dos maiores desgostos da minha vida foi nunca ter ido a um show sequer. Quando tive a oportunidade, era pirralha e minha mãe não me deixou ir.
Claro que, rebelde como era, briguei dias e dias por não ter ido e nunca me conformei com o impedimento.
Quando Renato Russo morreu, eu chorei o dia inteiro. Gritava com a minha mãe que ele tinha morrido e eu não o tinha conhecido pessoalmente, nunca tinha ido ao show da Legião por culpa dela. E por culpa dela* nunca mais poderia ir.
No dia seguinte, comprei o cd "A Tempestade", que eu estava enrrolando pra comprar e passei o outro dia inteiro chorando ouvindo as músicas que o Renato tinha feito e concordei com a crítica que dizia que era o cd mais triste da Legião.

"É tão estranho, os bons morrem jovens. Assim parece ser quando me lembro de você, que acabou indo embora cedo demais."



Essa é uma das fotos que eu mais gosto...


Da rebeldia á dor, da alegria á depressão, do nascimento do filho á descoberta da doença, os momentos mais marcantes, mais importantes... Tá tudo lá, no palco, pra que quiser ver, ouvir e se emocionar.
Ao final do espetáculo, Bruce agradeceu a presença de todos dizendo que naquele mesmo dia completavam 2 anos em cartaz com a peça e homenageavam os 12 anos da morte do Renato.
Um arrepio subiu á pele naquele instante e um frio na boca do estômago me deixou de olhos arregalados. Pensei: "Caraca, é mesmo, hoje é 11 de outubro". Eu e Bruno ficamos nos olhando estupefatos, Talita ficou sem ação e nessas horas só um palavrão traduz: PQP!
Não, não combinamos de ver a peça exatamente nesse dia. Foi de repente, sem relação e emocionante - até mesmo por esse dado que só ficamos sabendo no final.

Renato Manfredini Jr. faleceu no dia 11 de outubro de 1996. A música brasileira perdeu um dos seus maiores ícones. Se não me engano, hoje ele teria 48 anos.


|| Urbana Legio Omnia Vincit || Força Sempre ||




Pra quem quiser assistir a peça:
Teatro João Caetano
De 22/08 a 19/10 - Sex, Sab e Dom
Horário: sex e sab, às 19h30; dom, às 18h30
Preço: R$20,00 - R$10,00 (meia)

Carolina! Na verdade se chama Ana Carolina e não gosta de ser chamada de Ana. Não revela a idade, mas todo mundo diz que aparenta bem menos. Fotógrafa e estudante de Jornalismo. Mudou de área depois de anos insatisfeita com a profissão. Carioca, apaixonante e implicante. Carinha de 8, espírito de 80 anos. Chata, mal humorada e anti-social. Gosta de rimas simples, de frases bobas e é viciada em café. Na vida passada foi um gato tamanha preguiça. Tem mania de ter manias, coleciona coisas inúteis e acha ridículo isso de falar de si mesma em 3º pessoa.

 
Expresso pra Dois © Todos os direitos reservados :: Ilustração por Rafaela Melo :: voltar para o topo